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Transposição da Diretiva AML V: prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento ao terrorismo (Lei n.º 58/2020)

Alerta Legal nº126-Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto

No dia 31 de agosto de 2020 foi publicada, em Diário da República, a Lei n.º 58/2020 (a “Lei 58/2020”), que introduz no ordenamento jurídico nacional alterações no âmbito das medidas de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, transpondo para a ordem jurídica interna duas diretivas sobre este tema:
• Diretiva (UE) 2018/843, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2018, que altera a Diretiva (UE) 2015/849 relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo (“Diretiva AML V”); e
• Diretiva (UE) 2018/1673 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018, relativa ao combate ao branqueamento de capitais através do direito penal, com o objetivo de assegurar que os ordenamentos jurídicos dos Estados-Membros estão dotados de mecanismos e instrumentos penais coerentes e consonantes, que proporcionem uma cooperação transfronteiriça mais eficiente entre as autoridades competentes.

A 58/2020 procede à alteração de um conjunto vasto de normativos legais, entre os quais:
• Regime Jurídico de Acesso e Exercício da Atividade Seguradora e Resseguradora, aprovado no anexo I à Lei n.º 147/2015, de 9 de setembro;
• Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto (“Lei de PBC/FT”);
• Lei n.º 89/2017, de 21 de agosto (regime jurídico do Registo Central do Beneficiário Efetivo ou “RCBE”);
• Lei n.º 97/2017, de 23 de agosto (sobre a aplicação e execução das medidas restritivas da ONU ou da UE);
• Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro;
• Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro (Regime Geral das Instituições De Crédito e Sociedades Financeiras ou “RGICSF”).

De entre as alterações introduzidas, salienta-se antes de mais as introduzidas na Lei de PBC/FT, cujas principais doravante se sintetizam.

1. Verifica-se o alargamento do elenco de entidades abrangidas:

• Nas entidades financeiras, passam agora a estar abrangidas, as sociedades gestoras de fundos de titularização de créditos; os mediadores de seguros a título acessório do ramo vida; as sociedades de investimento mobiliário para fomento da economia; os gestores de fundos de capital de risco qualificados; os gestores de fundos de empreendedorismo social qualificados; os Fundos de investimento de longo prazo da União Europeia com a designação 'ELTIF' autogeridos; as sociedades de investimento e gestão Imobiliária em Portugal (vulgarmente “SIGI”);
• Nas entidades não financeiras, passam a estar obrigados os comerciantes que transacionem bens de elevado valor unitário e entidades que exerçam qualquer atividade com “ativos virtuais”. Entende-se por ativo virtual aquele que engloba a representação digital de valor que não esteja necessariamente ligada a uma moeda legalmente estabelecida e que não possua o estatuto jurídico de moeda fiduciária. Quanto a estas últimas saliente-se a obrigação de registo junto do Banco de Portugal; e
• Os agentes de instituições de pagamento, bem como os agentes e distribuidores de moeda eletrónica sediadas noutros Estados Membros passam a ser considerados entidades equiparadas às entidades obrigadas para efeitos dos artigos 72.º e 107.º da Lei de PBC/FT, verificando-se um reforço do regime a elas aplicado.

2. É agora imposta a adoção de medidas de diligência reforçada às entidades obrigadas sempre que estabeleçam relações de negócio, realizem transações ocasionais, efetuem operações ou, de algum outro modo, se relacionem com países terceiros de risco elevado.

3. É ainda de destacar a proibição de aceitação de pagamentos efetuados com recurso a cartões pré-pagos anónimos emitidos no estrangeiro, quer a entidade financeira se posicione como prestador de serviços de pagamento do ordenante (pagamentos efetuados), quer quando atue como prestador de serviços de pagamento do beneficiário (pagamentos recebidos).

4. No que concerne ao dever de identificação e diligência, a Lei 58/2020 prevê agora que a comprovação destes elementos possa ser feita através dos meios de identificação eletrónica, incluindo a assinatura eletrónica qualificada e autenticação segura do Estado através do site autenticação.gov.pt, ou mediante autorização do titular dos dados que seja subscritor de uma Chave Móvel Digital para a sua transmissão e apresentação a terceiros em tempo real através da utilização de aplicação móvel disponibilizada pela Agência para a Modernização Administrativa, I.P.(AMA).

5. No que concerne às entidades do setor imobiliário, salienta-se que a comunicação de elementos sobre transações imobiliárias e contratos de arrendamento ao IMPIC, I.P. deixa de ser feita em base semestral e passa a ser em base trimestral.

6. Por fim, no âmbito do regime sancionatório da Lei de PBC/FT, salientam-se as seguintes alterações:
• no leque de ilícitos criminais, a Lei de PBC/FT passa a prever expressamente a responsabilidade das pessoas coletivas pelos crimes tipificados nos artigos 157.º (Divulgação ilegítima de informação) e 158.º (Revelação e favorecimento da descoberta de identidade) da Lei de PBC/FT;
• nos ilícitos contraordenacionais, é alargado o elenco de contraordenações especialmente graves, salientando-se a criação de uma alínea de aplicação subsidiária, que prevê uma coima de 3.000€ a 1.000.000€ para pessoas coletivas e 1.000€ a 500.000€ para pessoas singulares.

No âmbito das alterações introduzidas, há também que destacar as alterações ao regime jurídico do RCBE, aprovado pela Lei n.º 89/2017, de 21 de agosto.

1. Passa a ser necessário garantir que a informação sobre os beneficiários efetivos contida no RCBE é disponibilizada aos registos correspondentes dos demais Estados-Membros, através da Plataforma Central Europeia criada pelo n.º 1 do artigo 22.º da Diretiva (UE) 2017/1132 do Parlamento Europeu e do Conselho.

2. Muito relevante para efeitos do conhecimento do beneficiário efetivo, é a novidade de o regime jurídico do RCBE passar a abranger os OICs nos critérios de aferição.

A Lei 58/2020 vem também introduzir alterações ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro:1. No artigo 368.º-A do Código Penal é alargado o quadro de ilícitos típicos subjacentes e as condutas típicas próprias do crime de branqueamento, que abrange agora, por exemplo, os factos ilícitos de burla informática, abuso de cartão de garantia ou de crédito e falsidade informática.
2. É igualmente agravada a moldura penal nos casos em que o infrator é uma entidade obrigada e cometa a infração no exercício das suas atividades profissionais.

Em anexo à Lei 58/2020 são republicadas as Leis n.º 83/2017 e n.º 89/2017, com a redação introduzida pela Lei 58/2020.

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, a 1 de setembro de 2020.

Para aceder ao texto integral da Lei por favor clique aqui.
 

 

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Miguel Cordeiro

+351 219 245 010

mcordeiro@ctsu.pt

 

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